Interligações
Amanda de Angelis
Dácio Rodrigues
Fabiana P.P.Barreira
Janaína de Lima Torres Galindo
Michelle Araújo
Prof. Ms Lucy Figueiredo(lmbfigueiredo@anhembi.br)
Resumo
Com objetivo de produzir um fotobook e um blog fotográfico, tendo como tema Espaços Urbanos e subtema Vias Urbanas, fez-se uma pesquisa sobre o significado das palavras vias e urbanas, da frase – Vias Urbanas - de suas representações, interrelações, interligações e conexões com a cidade de São Paulo. Utilizou-se as idéias antropológicas e literárias dos livros; “As Cidades Invisíveis” de Ítalo Calvino e “A Cidade Polifônica” de Massimo Canevacci, como base teórica para escolher uma grande obra viária atual de enorme visibilidade, o Rodoanel, como objeto representativo da interconectividade existente entre as estradas e vias que chegam e saem da cidade com outras facetas da vida da mesma. A obra tem como objetivo a melhoria do transito e da qualidade de vida dos habitantes da cidade, mas durante as pesquisas, outras questões apareceram. Ao atravessar áreas rurais, de periferia, de reserva florestal e de reserva de mananciais, a obra interconecta-se com o mercado imobiliário, com o abastecimento de água e os acidentes geográficos que moldavam o crescimento horizontal da cidade, influindo de diversas maneiras na vida cotidiana de seus habitantes.
Palavras-chave: Interligações. Rodoanel. Vias.
Introdução
A produção de um projeto interdisciplinar, que conterá todo o conhecimento apreendido no semestre, foi colocada como exigência do curso Tecnólogo de Fotografia. Trata-se de um texto imagético sobre os espaços urbanos, focado em suas vias, suas artérias de comunicação, de transporte. Começou-se uma pesquisa pelos dicionários, leitura de livros, consultas a ONGs, a agências governamentais e ambientais para delimitar um tema que poderia representar o significado de via, - um caminho entre dois pontos, meio de juntar, e a obra viária que estava sendo feita pelo Governo Estadual pareceu juntar todos os quesitos, pois pode-se dizer que ele liga, conecta, todas as vias da cidade de São Paulo. Com fotos aéreas e terrestres, montou-se um livro que apresenta algumas dessas interligações entre o Rodoanel e a cidade.
Interligações
Ao falar-se de vias, abre-se a possibilidade de conversar sobre vários assuntos. A medicina fala de vias aéreas ou intravenosas. A via telefônica leva os sinais elétricos de telefones e computadores através do mundo. Vias fluviais, vias inteligentes, vias de fato ou até via férrea, como existia no projeto do Rodoanel.
Feito para interligar as rodovias e a cidade de São Paulo, ajudando ao trafego desta, esta imensa obra orçada em sua totalidade em mais de 15 bilhões de reais, tem em projeto a passagem pelo lado norte da capital a travessia da serra da Cantareira, trecho mais complicado da obra por causa da geografia do lugar. Pelo lado oeste, a ligação entre a Rodovia dos Bandeirantes e a Rodovia Régis Bittencourt se encontra pronta desde 2002. Do lado leste da capital, se encontra em projeto, mas já licitada, tendo como ganhador, o mesmo consórcio que fez a parte sul, que foi entrega em abril de 2010 mesmo não estando completamente concluído. O gasto no trecho sul foi de 4,86 bilhões de reais, movimentou 60 milhões de metros cúbicos de terra, 800 mil metros cúbicos de concreto, 327 mil metros cúbicos de asfalto, cruzando matas, vales e duas zonas de preservação de mananciais aquíferos da cidade, limites geográficos histórico-culturais da cidade. Planejada com pouco cuidado e estudo, e entregue sem estar terminada, a obra serviu de palanque para o Governador, em exercício na época, que a inaugurou, mesmo correndo o risco de publicidade negativa, pois os sistemas de captação de efluxos industriais, que evitariam a queda dos mesmos nas águas dos mananciais, não se encontravam prontos, abrindo a possibilidade de contaminação das reservas de água potável da cidade. Isto revela o pouco caso do governo com a segurança e o bem estar da população.
“É o humor de quem a olha que dá forma a cidade de Zemrude. Quem passa assobiando, com o nariz empinado por causa do assobio, conhece-a de baixo para cima: parapeitos cortinas ao vento, esguichos. Quem caminha com o queixo no peito, com as unhas fincadas nas palmas das mãos, cravará os olhos à altura do chão, dos córregos, das fossas, das redes de pesca, da papelada. Não se pode dizer que um aspecto da cidade seja mais verdadeiro do que o outro,(...)” (Calvino, 1990.p.64)
Em pesquisa nos meios de comunicação oficiais do governo de São Paulo, da prefeitura da capital e de sua publicidade nos deparamos com uma visão grandiosa que nos fala sobre os benefícios de uma obra de grande vulto como sendo a solução dos problemas de transporte, da qualidade do ar, da qualidade de vida da própria cidade bem como das cidades do entorno da capital, visão amplamente divulgada nos meios de comunicação de massa que induz o cidadão a concordar com a idéia de benefícios sem questionar outros valores que estão implícitos em uma obra deste porte. Ao olharmos para setores da sociedade que fazem uma oposição consciente ou estudam os problemas relacionados à obra, percebemos em sua comunicação que existem problemas aos quais não foram dada a devida atenção na execução de partes do projeto. Falhas, desrespeito ao meio ambiente, à cidade e seus moradores. Falta de planejamento estratégico de longo prazo para o país. Como escreveu Calvino neste trecho do livro Cidades Invisíveis, é o humor de quem olha, com seu conhecimento, sua cultura que empresta significado a imagem vista. Com uma sequência de imagens aéreas e terrestres, será demonstrado uma versão de visão das interligações existentes entre a obra e os vários lados da cidade que o Rodoanel quase que abraça, circundando-a, interligando as comunicações viárias direcionadas a São Paulo.
“Se quiserem acreditar, ótimo. Agora contarei como é feita Otávia, cidade-teia-de-aranha. Existe um precipício no meio de duas montanhas escarpadas: a cidade fica no vazio, ligada aos dois cumes por fios e correntes e passarelas. Caminha-se em trilhos de madeira, atentando para não enfiar o pé nos intervalos, ou agarra-se aos fios de cânhamo. Abaixo não há nada por centenas e centenas de metros: passam algumas nuvens; mais abaixo, entrevê-se o fundo do desfiladeiro.
Essa é a base da cidade: uma rede que serve de passagem e sustentáculo”. (AS CIDADES DELGADAS - ÍTALO CALVINO)
São Paulo, uma cidade que foi fundada por jesuítas, entre rios que formavam um obstáculo natural que dificultava o crescimento, mas ajudava no transporte, na alimentação, na comunicação entre a cidade e suas vizinhas. Foi durante sua vida lançando suas ruas, como tentáculos de um polvo ou como fios de uma teia-de-aranha, foram ligando-se uma a uma, quarteirão a quarteirão, avenidas, praças, pontes, estradas, túneis e toda uma rede de vias voltadas ao transporte.
O cidadão habitante, o paulista, correndo de um lado para outro, sentindo a transformação apressada da cidade, orgulhoso da sua condição de protagonista desta releitura da cidade, de seus valores e dos símbolos culturais deixados por seus fundadores, continuam a trabalhar cada vez mais, 24 horas por dia para colaborar nesta mudança, que é a própria essência da cidade. “Algumas das interpretações correntes sobre as tendências atuais da nossa cultura se dividem entre os que classificam o sacro como em declínio inexorável, em proveito de uma vida profana, e os que, pelo contrário, enfatizam sua revivescência, achando que o sacro, depois de ter vencido o Oriente, presta-se a ajustar contas também com o Ocidente.” (Canevacci, 147). Na cidade que não para, muda-se o sacro em profano e deste para o sacro, mistura-se os conceitos, as etnias, expande-se as ruas, os paradigmas, a cidade até encontrar outro obstáculo que seja visto como barreira ao crescimento.
Oposição Consciente
Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental em entrevista disse, ser possível a elaboração de um hidro anel em torno da cidade, meio de transporte eficiente e barato, ou seria melhor um ferro-anel que poderia ser interligado com ferrovias que viriam do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Centro-Oeste brasileiro formando uma vasta rede ferroviária de transporte barato, amigável ao meio-ambiente, que ajudaria a baixar o custo Brasil e a inflação, e a manter ou melhorar a qualidade de vida da população em geral ao baratear fretes e substituir milhares de caminhões, poluindo menos o meio-ambiente.
Produzindo
Fez-se pesquisa sobre o significado de vias urbanas e cogitou-se temas variados, tais como moradores de rua, luxo e lixo na avenida, túneis de São Paulo, pontes, grafismo das vias da cidade e a cada tema surgia um novo tema e uma nova problemática. A iconografia consultada, ampliava ainda mais as possibilidades. Imagens diurnas, noturnas, em angulos e maneira inusitados, mostravam novos significados para vias urbanas. O discurso das imagens, muitas vezes, ia além da aparencia mostrada à vista. Via-se ali o contraditório e nesse espírito, encontrou-se algo que está em torno da cidade, fora, mas que interliga todas as suas vias e sincretiza a ideia de urbano cosmopolita, o Rodoanel. Saiu-se a campo para fazer reportagem com entidades e no próprio local da obra. Fez-se um total de 237 fotografias. As fotografias aéreas feitas mostram a grandiosidade da obra e sua interferência por onde passa. As fotografias terrestres mostram detalhes do entorno, das pontes e da falta de canos para recolher materiais químicos, que porventura caiam das pontes que passam pelas represas.
Considerações finais
A opção feita pelo governo do Estado, em deixar de lado um ferro anel só concluir a parte rodoviária do projeto, beneficia o transporte rodoviário, fabricantes de pneus, indústria petroleira, montadoras de automóveis e caminhões, as grandes construtoras e a especulação imobiliária em detrimento de uma visão de longo prazo de manutenção de mananciais, consequentemente de abastecimento de água e manutenção da possibilidade da cidade continuar a ser habitada, transporte barato e qualidade de vida boa, planejamento de longo prazo, deve-se a grande força que o lobby petrolífero tem junto aos governos. Grupo organizado que movimenta bilhões de reais todos os anos e que cuida apenas de seus interesses, em oposição à sociedade civil desorganizada, que não conhece seus direitos e não sabe lutar pelos seus interesses. Sofrendo as consequências de políticas eleitoreiras que pouco estudam as soluções dos problemas da cidade.
Referencias:
CALVINO, Ítalo. Cidades Invisíveis. São Paulo: Companhia das Letras,1990.
CANEVACCI, Massimo. A cidade polifônica: Ensaio sobre a antropologia da comunicação urbana. São Paulo. Livros Studio Nobel Ltda. 2004.
Dicionário eletrônico Houaiss.
Dicionário eletrônico Michaellis.